terça-feira, 14 de outubro de 2014

Ulisses e a Sereia



Ulisses ao desejo poderia dar vazão
Se as cordas pudessem ser cortadas?
Ele ao mar lançar-se-ia por paixão
Se as mãos lhe fossem libertadas?

Ele se entregaria ao ser de magia,
em que seu corpo tudo contagia?
Então qual lenda Homero contaria,
se tal romance em tudo o contraria?

Ao drama de Ulisses se está atento,
mas lembremos, não está sozinho
Há sim uma Sereia em seu caminho
Que vive de igual seu sofrimento

Separados desejam-se nesse mundo
Mas a natureza os traiu. Será justo
Que se beijem à tona, ou ao fundo
Mas jamais possam dormir juntos?

Ser demoníaco é Sereia, me disseram
Aqueles que a ela ouvidos não deram
Mas se a desejo, me entrego à trama
Ouço a voz solitária, sinto o drama

Ela deseja a ele, e viveria fora d’água
Ele não é peixe, se afoga em mágoas
Ela se sufocaria se respirasse o ar
E ele morreria, pois não é ser do mar

Ulisses largaria o leme, e a tripulação
Abandonaria, esqueceria sua missão
Mergulharia, e atrás ficaria a solidão
E fugiria assim de toda a atribulação

Se a lembrança da terra é só espanto
E o encanto do canto leva ao pranto
E se a água não basta e se incendeia
Quer lançar-se nos braços da sereia.

Que dilema há que a lenda margeia?
Escapam dele Ulisses e a Sereia?
Do dueto de amor, se ouvirá a voz?
Estamos nós, Sereia e Ulisses, a sós?

12 de junho de 2009